sábado, 31 de janeiro de 2009

Nos trilhos perdida

Nesta idade tão promissora, quando já começamos a necessitar de projetos para o futuro e a tomar decisões carregadas de responsabilidades, é bem provável que alguém fique bastante preocupado.
Que cada pessoa, creio atingir a maioria, ponha-se a trilhar um caminho já determinado pelos pais ou por outras entidades; se ganha um alívio temporário. Não é mais preciso construir trilhos, apenas manter-se nalgum já pronto. Como estes trilhos já estão há muito concluídos e nos levam, quase invariavelmente, a um lugar certo e seguro; parece-nos mais propício falar de um percurso indeterminado, que muitos diriam tratar-se de um descaminho, pois aquele que descarrilha sua vida do trilho principal convence-nos de que não faz idéia de para onde está indo.
É verdade que descrever a vida de alguém comparando-a com algo tão sólido e retilíneo feito um trilho ferroviário não é fiel nem justo diante da multiplicidade de destinos que se afiguram planeta a fora. Porém, creio que metáforas pouco eficientes e generalizantes, como esta acima, são necessárias para afastar comentários contra-argumentativos descabidos.
Seguindo com a idéia inicialmente proposta, concentremos nosso olhar para um caso particular; apesar de único, mantém-se comum e repetitivo se analisados sob pré-requisitos problemáticos para nossa época.
Trata-se de uma moça jovem. Dotada de espírito alegre e sociável, seria uma mulher de causar inveja a muitas, não fosse o traço mais marcante de sua personalidade; era por demais distraída. Os médicos diagnosticaram déficit de atenção e hiperatividade quando a família julgou ser esta característica uma desvantagem em relação a outras moças da sua idade.
Foi numa reunião com antigas amigas, na qual tomavam café como se fosse vodka, que esta moça tomou-se conta do dilema comum a todos do sexo feminino. Depois de cansativos relatos, recheados de reclamações e de falsas exibições de satisfação, percebeu ela que, erradas ou não, suas amigas haviam feito as respectivas escolhas.
Uma de suas duas melhores amigas de infância, com corpo de baixa estatura e curvas acentuadas, que desde menina adorava posar para uma câmera fotográfica, casou-se jovem demais para aventurar-se numa carreira profissional e os filhos subseqüentes dificultaram ainda mais qualquer tentativa neste meio. A segunda queixava-se de terem lhe concedido uma profissão exclusivamente feminina e dizia-se decidida a rejeitar a dádiva do matrimônio. Consciente disto, a moça alegre e distraída ficara preocupada. Lembrou-se de ter visto na televisão ou em outros meios de comunicação que a mulher pós-moderna se vê dividida entre o casamento e a carreira. Por um instante ficou orgulhosa de se encaixar no perfil da mulher pós-moderna, este adjetivo suscitava nela um sentido histórico, no entanto, nenhum de seus namorados haviam lhe despertado o impulso matrimonial, tampouco seu emprego soava-lhe melhor que a profissão de esposa.
Para alguém desinformado das infinitas possibilidades humanas acreditaria mesmo estar vivendo um dilema. A moça, oriunda de uma família de classe média, não recebera educação muito refinada, limitando-se aos cumprimentos básicos da boa-educação e etiqueta. Ainda assim, com o cérebro lento e desatento, esforçou-se por analisar os trilhos do seu destino. Indignou-se de só haver duas opções. Mesmo não tendo o espírito ambicioso e aventureiro daqueles que, em séculos remotos, montavam em seus cavalos e corriam para a linha do horizonte desconhecido, ela queria ter mais que duas opções.
Os anos se passaram sem que ela decidisse por nenhuma dessas duas vias, que apesar de seguras, não garantiam a felicidade. Para olhos alheios, ela estava nos trilhos de um trem desgovernado. Mudou várias vezes de direção, tentou ser atriz, abriu um salão de beleza, casou e se divorciou. Depois de tudo isso, a moça continuava distraída.

TEXTO INCOMPLETO

3 comentários:

guim lambret disse...

eu gostei.
volto depois pra ler as memorias de um funeral :)

Natascha Paschoalique disse...

Lu, gostei muito do que li, está mesmo entrando de cabeça nesse mundo da escrita.
Já está criando um estilho todo seu. :D

Gabriela Goulart disse...

Muito interessante, lu!

A principio fiquei tentando dar nomes aos bois mas, comprovando a sua criatividade, apesar de encontrar aspectos semelhantes aos atribuídos a pessoas da tua convivência ou até mesmo a ti, encontrei originalidade nos personagens, bem descritos, como se os tivesse conhecendo agora mesmo...resumindo, gostei bastante e espero ler alguma continuação!