segunda-feira, 9 de março de 2009

Cadáver Excelente N. 1

Sobre a mesa abrem-se as portas rumo a sede
cai o silêncio que ofusca a fome imediata
seca a boca que deseja
os gritos das línguas amputadas
varre-se o sangue que despeja
sem a audácia profana do abismo
onde as misérias zombeteiras estorcem-se na rede cáustica da mudez
devaneios que rondam pegajosos
a surdina que espreita o fim
traidor da lua ao roubar suas carícias de verão

Fala Democrático, silenciosos estamos
na ausência do inimigo felino
a delogar as asas tórridas de rubros céus
queres-me fanático, papagaio sério
o sagaz dromedário sem corcovas
cujos rins retumbam na estiagem da noite
então se vê a luz queimando com as bruxas
na aurora fustigante do começo de uma decadência
que as mãos súplices manam do bojo das vontades raquíticas
aveludam-se os ossos com o teor da autoridade
pitoresco obelísco vaidoso
apunhalando a nodosa serpente num folguedo de traças
gemi um grito de pudor
desesperada inércia iminente vitória
a liberdade demente cai por terra em dissonâncias ávidas de um amanhecer em cinzas.

Poema composto por Thierry Motta, Luciana Marcelino e Lourenço Tristão.

sábado, 31 de janeiro de 2009

Nos trilhos perdida

Nesta idade tão promissora, quando já começamos a necessitar de projetos para o futuro e a tomar decisões carregadas de responsabilidades, é bem provável que alguém fique bastante preocupado.
Que cada pessoa, creio atingir a maioria, ponha-se a trilhar um caminho já determinado pelos pais ou por outras entidades; se ganha um alívio temporário. Não é mais preciso construir trilhos, apenas manter-se nalgum já pronto. Como estes trilhos já estão há muito concluídos e nos levam, quase invariavelmente, a um lugar certo e seguro; parece-nos mais propício falar de um percurso indeterminado, que muitos diriam tratar-se de um descaminho, pois aquele que descarrilha sua vida do trilho principal convence-nos de que não faz idéia de para onde está indo.
É verdade que descrever a vida de alguém comparando-a com algo tão sólido e retilíneo feito um trilho ferroviário não é fiel nem justo diante da multiplicidade de destinos que se afiguram planeta a fora. Porém, creio que metáforas pouco eficientes e generalizantes, como esta acima, são necessárias para afastar comentários contra-argumentativos descabidos.
Seguindo com a idéia inicialmente proposta, concentremos nosso olhar para um caso particular; apesar de único, mantém-se comum e repetitivo se analisados sob pré-requisitos problemáticos para nossa época.
Trata-se de uma moça jovem. Dotada de espírito alegre e sociável, seria uma mulher de causar inveja a muitas, não fosse o traço mais marcante de sua personalidade; era por demais distraída. Os médicos diagnosticaram déficit de atenção e hiperatividade quando a família julgou ser esta característica uma desvantagem em relação a outras moças da sua idade.
Foi numa reunião com antigas amigas, na qual tomavam café como se fosse vodka, que esta moça tomou-se conta do dilema comum a todos do sexo feminino. Depois de cansativos relatos, recheados de reclamações e de falsas exibições de satisfação, percebeu ela que, erradas ou não, suas amigas haviam feito as respectivas escolhas.
Uma de suas duas melhores amigas de infância, com corpo de baixa estatura e curvas acentuadas, que desde menina adorava posar para uma câmera fotográfica, casou-se jovem demais para aventurar-se numa carreira profissional e os filhos subseqüentes dificultaram ainda mais qualquer tentativa neste meio. A segunda queixava-se de terem lhe concedido uma profissão exclusivamente feminina e dizia-se decidida a rejeitar a dádiva do matrimônio. Consciente disto, a moça alegre e distraída ficara preocupada. Lembrou-se de ter visto na televisão ou em outros meios de comunicação que a mulher pós-moderna se vê dividida entre o casamento e a carreira. Por um instante ficou orgulhosa de se encaixar no perfil da mulher pós-moderna, este adjetivo suscitava nela um sentido histórico, no entanto, nenhum de seus namorados haviam lhe despertado o impulso matrimonial, tampouco seu emprego soava-lhe melhor que a profissão de esposa.
Para alguém desinformado das infinitas possibilidades humanas acreditaria mesmo estar vivendo um dilema. A moça, oriunda de uma família de classe média, não recebera educação muito refinada, limitando-se aos cumprimentos básicos da boa-educação e etiqueta. Ainda assim, com o cérebro lento e desatento, esforçou-se por analisar os trilhos do seu destino. Indignou-se de só haver duas opções. Mesmo não tendo o espírito ambicioso e aventureiro daqueles que, em séculos remotos, montavam em seus cavalos e corriam para a linha do horizonte desconhecido, ela queria ter mais que duas opções.
Os anos se passaram sem que ela decidisse por nenhuma dessas duas vias, que apesar de seguras, não garantiam a felicidade. Para olhos alheios, ela estava nos trilhos de um trem desgovernado. Mudou várias vezes de direção, tentou ser atriz, abriu um salão de beleza, casou e se divorciou. Depois de tudo isso, a moça continuava distraída.

TEXTO INCOMPLETO

Memórias de um funeral

Uma das coisas que considero bastante interessante nesta vida cheia de mistérios é a experiência da primeira vez. Cheguei ao mundo como uma tabula rasa, nenhuma inscrição; ou para ser mais moderna, como um carro novo, zero quilômetros rodados de experiência.
Tudo que conheci, através dos meus sentidos e ao longo de 22 anos, exigiu uma primeira vez, um primeiro contato. É uma pena que a maioria das coisas comuns do dia-a-dia, não por isso menos interessantes, me foram apresentadas ainda bebê. Nesta idade, eu não julgava interessante guardar na memória o processo do primeiro contato e o impacto que ele causava em mim.
Fico imaginando como seria recordar a sensação de quase me afogar no leite materno, ou a surpresa de encontrar seres diferentes de nós humanos, notar que alguns deles precisam andar de quatro e outros tem a liberdade de voar. O primeiro contato geral com o mundo, ocorrido logo após o parto, deve ter sido algo estranho. A tabulinha rasa que eu era não tinha nenhuma referência de outro mundo para comparar com este. Tudo foi uma novidade, tão rápida e chocante que nem deu tempo de gravar na memória.
Meu primeiro contato com um cadáver lembro-me bem. Foi aos cinco anos. Já ouvira meus pais falando de gente morta, porém nunca tinha visto um falecido com meus próprios olhos. A notícia da morte do vovô chocou a família inteira, todos ficaram tristes e em silêncio, larguei as bonecas num canto qualquer e imitei meus pais em respeito a meu avô. Minha mãe pediu que eu tomasse um banho e colocasse a roupa que ela designou. Atendi sem nenhum protesto. Quando chegamos ao velório, fui de mãos dadas com meu pai até o caixão. Vi o corpo dele deitado e os olhos cerrados como se estivesse dormindo, somente quando toquei em sua pele fria percebi a diferença entre estar vivo e estar morto. Logo que notei a frieza da morte recolhi rapidamente minha mão, fiquei com medo que meu sangue congelasse por contaminação. É claro que fiz de tal maneira que ninguém percebeu minha repulsa pelo cadáver. Perguntei ao meu pai o que aconteceria com ele. Meu pai respondeu carinhosamente que sua alma iria ficar ao lado de Deus, mas o que eu queria saber era do corpo. Para mim, a alma era algo que Deus emprestava para gente poder viver, como tomamos o oxigênio emprestado do ar. Eu era o meu corpo e o meu corpo era eu. O que mais me assustava na morte era o que aconteceria com o corpo depois que eu morresse. Tive a resposta no dia seguinte.
Já estávamos no cemitério e todo aquele cortejo fúnebre já havia passado. Quando vi descerem o caixão com o corpo de meu avô trancado para sempre lá dentro entendi o que acontecia com as pessoas depois da morte. Seríamos todos enterrados. Ficaríamos para sempre dentro de uma caixa preta por debaixo da terra. Logo iria acabar o oxigênio e então a alma subiria para o céu, mas o corpo continuaria lá, preso por toda a eternidade. Todos os sorrisos, todos os abraços e seu coração ficariam lá embaixo. Ele estaria sozinho, trancado no escuro. Para mim, isso era um castigo. Se a alma tinha direito de ficar perto de Deus depois da morte, o corpo era castigado. Também pensei em um detalhe importante, todas as pessoas do mundo que morreram, e foram muitas, calculei, acabaram debaixo da terra, pensei então que teriam de reservar muita terra para servir de cemitério, pois ainda havia muita gente no mundo para ser enterrada.
Estávamos voltando para casa. Eu não queria deixar meu avô lá embaixo e voltar como se nada estivesse faltando. Achei uma injustiça o que estavam fazendo com meu vovô. Fiquei com raiva dos adultos que faziam isso e ao mesmo tempo senti pena de meu pai, eu sabia que ele também não queria deixar o pai dele lá embaixo e eu sabia que o vovô fazia mais falta para ele do que para mim. Ninguém protestou e voltamos para casa.
Hoje, sei que o corpo apodrece depois que perde os sinais vitais, somos matéria orgânica como uma fruta. Morrer é arrancar uma maça do pé de macieira. Só não sei o que acontece com a alma. Naquela época eu tinha medo do que aconteceria com meu corpo, agora tenho medo do que acontecerá com a minha alma. Enquanto isso, aguardo meu primeiro contato com a morte.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

O Sol

Você come carne, um boi. Este boi comeu uma planta, capim. Este capim não comeu ninguém, mas cresceu. Como? Com luz, então ele comeu a luz? Pode ser. O que interessa é que como você pode notar, tudo que temos de vida na terra vem da luz. Esta energia passa para as plantas, que crescem, que comemos e crescemos também. Ou seja, parafraseando várias igrejas, Deus, criador da vida, é luz; a vida é luz. Bem mas o que é essa luz? Da onde vem? Vem do sol, uma bola gigantesca, cuspindo raios luminosos e de calor que chega até a terra e faz brotar vida em qualquer canto. O raio de luz é uma onda eletromagnética que se propaga no vácuo, onde não existe matéria, e esse raio de luz percorre infinitamente o universo. Quando encontra um anteparo de matéria, a terra, a lua, nossos olhos, etc. esse reflete, ou seja, bate e volta, mas continua seguindo seu caminho, até o infinito. Aqui na terra durante o dia, quando o sol nos brinda, podemos enxergar tudo,tudo, porque? porque o espaço está infinitamente, completamente cheio de raios luminosos, para onde quer que você olhe tem raios luminosos, senão você não enxergaria nada, se em algum ponto não houvesse um raio luminoso batendo e voltando você veria um preto, um ponto preto, um buraco negro. Portanto, quando vemos, vemos luz, vemos vida. E esta é infinita, porque um raio de luz, energia, nunca acaba, percorre o infinito eternamente. Luz é vida, luz é eterna, vida eterna.